Os efeitos da pandemia na transição energética
As expectativas eram que a recuperação pós-pandemia iria ser sustentada no acelerar da transição energética a nível global. Uma oportunidade que não terá sido devidamente aproveitada.
A pandemia que assolou o mundo nos últimos dois anos criou uma crise global sem precedentes, com as atividades económicas a desacelerarem e os fluxos de comércio, transporte e pessoas a reduzirem drasticamente. Segundo as contas da Agência Internacional de Energia (IEA), os países em isolamento social integral têm sofrido um declínio de 25% na procura de energia, enquanto os países em situação de distanciamento social parcial registaram uma queda de cerca de 18% no consumo energético. Mas nem tudo é negativo: as projeções indicam uma redução de 8% nas emissões globais de CO2.
Mas apesar de todas as expectativas de que a recuperação pós-pandemia iria ser sustentada no acelerar da transição energética a nível global, esta “oportunidade histórica foi perdida”, conclui o relatório anual da REN21, divulgado em janeiro deste ano. Um documento que alerta para o facto de a transição para a energia limpa global não estar a acontecer, sendo, por isso, improvável que o mundo consiga cumprir as metas climáticas desta década. “Apesar das evidências de que as energias renováveis são a fonte de energia mais acessível para melhorar a resiliência e apoiar a descarbonização, governos em todo o mundo continuam a recorrer a subsídios a combustíveis fósseis para manter as contas de energia sob controlo. Essa lacuna crescente entre a ambição dos países e a ação no terreno é alarmante e envia um alerta claro de que a transição energética global não está a acontecer”, menciona Rana Adib no Renewables 2022 Global Status Report (GSR 2022), publicação que vai já na sua 17.ª edição.
Investimento em energias renováveis será crucial
A Associação de Reguladores de Energia dos Países de Língua Oficial Portuguesa (RELOP) publicou um relatório em que examina as repercussões sentidas pela pandemia covid-19 na regulação do setor energético, ao longo de 2020, que abrange as medidas tomadas pela Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos – ERSE.
O documento explana que no setor energético, a recuperação económica terá de passar pelo equilíbrio entre o crescimento económico mundial, tendo em conta as suas particularidades regionais e a criação de um sistema energético sustentável a longo prazo.
“Paralelamente, o investimento em energias renováveis será crucial para a descarbonização do setor e para a redução da dependência de carbono. A diminuição do consumo e dos preços foi transversal aos setores da eletricidade, gás e combustíveis. Em função dos mercados energéticos internacionais e da quase total paragem do setor da aviação na sequência das restrições de circulação transfronteiriças, esta queda foi mais acentuada no setor dos combustíveis quando comparado aos setores do gás e eletricidade.”
O relatório estima que o gás natural, enquanto fonte de energia transicional no período de recuperação, se reestabeleça mais rapidamente que outros combustíveis como o petróleo. “A procura de gás natural é provável que aumente sobretudo na Europa onde o gás natural liquefeito (GNL) compõe uma parcela mais substancial do mix energético.”
Transição para as energias limpas é fundamental
Expondo que “a regulação energética contribuiu em larga medida para a resiliência económica e técnica do setor”, o relatório avança que os reguladores optaram por priorizar a mitigação dos riscos para o consumidor, procurando manter, em simultâneo, o equilíbrio económico-financeiro do setor. “Importa salientar os imprescindíveis contributos dos reguladores na monitorização e análise transparente do mercado e do setor, possibilitando a implementação de políticas baseadas em dados estatísticos fiáveis e robustos. Fruto do seu caráter vital na resposta à crise, a regulação poderá vir a desempenhar um papel mais ativo no processo de recuperação económica e da transição energética.”
Assim, ultrapassado o período de emergência, “cabe aos reguladores avaliarem as vantagens e desvantagens do regresso a um marco regulatório pré-covid ou a criação de um novo quadro que integre boas práticas e lições interiorizadas da resposta regulatória em tempos de pandemia”.
Segundo o Conselho da União Europeia, a produção e o consumo de energia são atualmente responsáveis por 75 % das emissões de gases com efeito de estufa da UE, pelo que a transição para as energias limpas é uma condição prévia para pôr a UE no caminho da neutralidade climática até 2050 e uma grande oportunidade para estimular e apoiar a recuperação da economia da UE após a pandemia de covid-19.